quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Uma breve viagem (15/10/2003)

Quando eu era criança ouvia estórias contadas por minha avó, por minha mãe e por uma das moças que moraram conosco tendo por finalidade nos ajudar com as tarefas da casa. Eu gostava muito quando, antes de dormir, podia ter aqueles momentos de pura fantasia. Porém, as estórias que mais me empolgavam eram contadas por homens e mulheres da roça que, rompendo as noites escuras, através da estrada de chão, chegavam à fazenda onde passei muitas férias com meu pai e parentes.

As noites daquele lugar traziam, sempre, um clima mágico: escuridão estrelada, pássaros que gritavam, morcegos em vôos rasantes e, principalmente, os espíritos pagãos, conhecedores dos "mistérios" da mata fechada e da névoa que se misturava à luz da Lua. Tudo me fascinava, movendo a fértil imaginação infantil. Aqueles espíritos pagãos, homens e mulheres da roça, pareciam conhecer minha curiosidade, pois sempre surgiam com estórias mais diferentes e sobre as mais variadas personagens. Era interessante como muitas vezes eles conseguiam transformar certas histórias em estórias, digo, eles me faziam confundir umas com as outras.

Onças, lobisomens, cobras enormes, caiporas, vultos desconhecidos, entre outros, eram atuantes certos daqueles espetaculares contos noturnos que, com facilidade, me faziam viajar por ilusões e idéias. Praticamente era transportado para outros mundos e, de certa forma, me era permitido vislumbrar algo da subjetiva criação pela qual, em determinados momentos, podia me deparar comigo mesmo e com algumas das minhas vontades, facilidades e dificuldades.

O tempo passou e, aos poucos, a força e vida dos monstros e heróis das estórias foram se esvaindo. Hoje, com certa freqüência, me pego pensando na felicidade que aquelas noites traziam. As recordações daqueles tempos me fazem refletir e, em uma dessas reflexões, me veio a pergunta: por que aquelas estórias me encantavam tanto? Não sei ao certo, mas acredito que a vida daqueles "causos" estava na aventura que eles me permitiam. Haviam os momentos de medo, pois a mente me pregava suas peças, mas isso não impossibilitava o mergulho pleno naqueles mundos trazidos de forma tão sublime.

Ao que percebo, o "X" da questão estava na curiosidade e na vontade de que a estória não chegasse ao seu fim. A felicidade estava em não saber onde aquilo tudo ia me levar e, mesmo assim, me deixar levar. A alegria estava em desbravar, absorto, os "mistérios" cheios de sabedoria e novas possibilidades! Mas essa percepção me traz uma nova pergunta: por que, ao "crescermos", passamos a nos preocupar tanto com o que será no final e deixamos de prestar atenção aos ricos detalhes?



4 comentários:

Anônimo disse...

Engraçado que muitas vezes as pessoas ao nosso redor tem indagações parecidas com as nossas e nem ao menos percebemos simplesmente porque não a compartilhamos. Ao compartilhar seus pensamentos e vivencias,faz,a quem ler,recordar de suas próprias indagações. É algo que sempre me pergunto, o porque de não preservarmos certas atitudes de quando eramos crianças para que possamos ter,de vez em quando,impressões da infância?
Sinceramente,não sei!!!
Mas ainda assim prefiro continuar vendo "coisas",sentindo "arrepios" e acreditando em caiporas...rs....do que tornar-me alguém "mais ou menos"!!!Bjs!

Anônimo disse...

essa me lembrou bastante dos causos de lirvusia q ouviamos dos antigos do vale...
viagei lendo isso...
um sonho...

ok assim?

até

see you

Mariazinha

Anônimo disse...

Que saudades da minha infância.Que vontade que o tempo pudesse voltar.Vontade de não ter com que se preocupar.Saudade de ir pro sitio de um primo mais velho,que nem casa tinha.Acampávamos em barracas.Escovar os dentes com água de chuva,era muito massa.kkkkk
Tempo bom.Ainda bem que pude viver tudo isso.

Dah disse...

Se eu pudesse viver outra vez mudaria só alguns detalhes talvez, mais se fosse pra viver intensamente todas as sensações que a vida hoje me proporciona então eu faria tudo igual do jeito que é !!!
Assim como você demonstra estar fazendo a cada dia que passa.
Seu texto é de muito bom gosto e simplesmente perfeito ...